sexta-feira, 11 de março de 2011

Arthur Rimbaud

Engoli um belo trago de veneno. As minhas entranhas ardem. A violência do veneno torce meus membros, me deixa disforme, me derruba. Estou morrendo de sede, sufoco, não posso gritar. É o inferno, eterna pena! Vejam como o fogo se levanta! Queimo como deve.
(...)
     Lá, não serão almas honestas, que me querem bem...Venham... Tenho um travesseiro na boca, elas não me ouvem, são fantasmas.
     Ah, isto! o relógio da vida parou há pouco. Não sou mais ao mundo. 
(...)  Vou desvendar todos os mistérios: mistérios religiosos ou naturais, morte, nascimento, futuro, passado, cosmogonia, vazio. Sou mestre em fantasmagorias.
     Escutem!
     Tenho todos os talentos! — Não há ninguém aqui e há alguém: eu não gostaria de derramar meu tesouro. — Querem cantos negros? Querem que eu desapareça, que mergulhe à procura do anel? Querem? Farei ouro, remédios. 
     Decididamente, estamos fora do mundo. Nenhum som. Meu tato desapareceu.
     Ah! meu castelo, minha porcelana, meu bosque de salgueiros. As tardes, as manhãs, as noites, os dias... Cansei!
Morro de cansaço. É o túmulo, vou  aos vermes, horror do horror! Satanás, brincalhão, você quer me dissolver, com teus charmes. Eu reclamo. Eu reclamo! uma espetada, uma gota de fogo.
Ah! voltar à vida! Jogar os olhos nas nossas deformidades. E este veneno, este beijo mil vezes maldito! A minha fraqueza, a crueldade do mundo! Meu Deus, piedade, esconda-me, não sei me comportar! — Estou escondido e não estou.


(Uma Estadia no Inferno - Noite no inferno.)